terça-feira, 12 de novembro de 2013

O BALÃO JUNINO, ENFIM, É RECONHECIDO NA CASA DO POVO BRASILEIRO






PROJETO DE LEI Nº7622 DE 2013

                                     (Do Sr. Hugo Leal)

Disciplina as atividades envolvendo balões de papel não tripulados e sem potencialidade de causar incêndio, reconhecendo-as como elemento da cultura popular e do folclore brasileiro.
                             O Congresso Nacional decreta:
Art. 1º A presente Lei disciplina as atividades envolvendo balões de papel não tripulados e sem potencialidade de causar incêndio, reconhecendo-as como elemento da cultura popular e do folclore brasileiro.
Art. 2º Para os efeitos desta Lei entende-se por atividades de baloeirismo a confecção artesanal, a soltura e o resgate, independente da modalidade, individual ou coletiva, de balões de papel não tripulados, desprovidos de potencialidade ofensiva à integridade física e/ou patrimonial.
§ 1º Não integra a prática da atividade de baloeirismo o comércio e o transporte de balões de papel não tripulados e sem potencialidade de causar incêndio.
§ 2º Todo e qualquer conhecimento de confecção de artefato, mecanismo ou dispositivo relacionado com a prática do baloeirismo, será de domínio público.
Art. 3º Considera-se, para todos os efeitos legais, sem potencialidade de causar incêndio, a atividade de baloerismo que observar os seguintes critérios técnicos:
                            I - balão de papel, sem potencialidade de causar incêndio, o artefato confeccionado em ‘papel seda’ ou de baixa gramatura, inflado por maçarico e mantido no ar por tocha, mecha ou bucha:
                            a) autoextinguível, em razão da relação entre o volume e o peso do material utilizado na tocha e da observação das condições meteorológicas; ou
                            b) extinguível por sistema de supressão do fogo que, além das características da alínea "a", seja equipado com sistema mecânico ou eletromecânico de extinção do fogo.
                            II - balão solar, sem potencialidade de causar incêndio, artefato de papel seda inflado por maçarico e mantido no ar exclusivamente por energia térmica de origem solar;
                            III – balão junino, sem potencialidade de causar incêndio, o artefato de papel seda, com comprimento de até duzentos centímetros, com diâmetro de boca correspondente a, no mínimo, quinze por cento de seu tamanho e mantido no ar por meio de tocha, mecha ou bucha autoextinguível, elaborada com algodão e parafina, pesando até cento e cinquenta gramas.
§ 1º Considera-se mecha, tocha ou bucha seca autoextinguível, a fabricada em algodão hidrófilo ou papel tissue e parafina, totalmente consumível durante a permanência do balão no ar, sem deixar qualquer vestígio ou resíduo capaz de causar incêndio.
§ 2º O balão de papel observará ainda as seguintes características:
                            I - placa de identificação metálica acoplada à boca, que identifique, mediante inscrição vazada ou em relevo, o responsável por sua soltura;
                            II - o número da autorização de soltura fornecida pelo órgão do Poder Público competente;
                            III - equipamento refletor de radar do controle de tráfego aéreo, conforme regulamentação da autoridade aeronáutica, quando necessária;
                            IV - sistema mecânico acionado pela própria combustão da tocha, por temporizador e/ou através de rádio controle, para limitar o seu tempo de voo, conforme regulamentação da autoridade aeronáutica;
                            V - equipamento de rastreamento, ressalvada a sua dispensa a critério das autoridades.
§ 3º O balão de papel de uso noturno deverá observar, além dos itens de segurança, a presença de sinal luminoso estroboscópio ou similar a ser definido pela autoridade aeronáutica.
§ 4º É vedado o uso de fogos de artifício como lastro ou carga para qualquer espécie de balão de papel.
Art. 4º O calendário anual de exposições, festivais e as revoadas de balões de papel, assim como a prática de soltura fora destes eventos, serão realizadas em locais previamente definidos pelas autoridades públicas responsáveis pela fiscalização e segurança.
§ 1º A autoridade pública responsável pela autorização e segurança deverá observar:
                           I - as condições meteorológicas;
                           II - a proximidade com as redes elétricas, a vegetação e a área urbana;
                           III - o provável raio de alcance;
                           IV - a altura altitude estimada a ser atingida;
                           V - a trajetória presumida;
                           VI - a quantidade de balões e seus respectivos           tamanhos; e
                           VII - todos os dados necessários para garantir a normalidade do tráfego aéreo, a preservação do meio ambiente e a segurança dos cidadãos e do patrimônio público e privado.
§ 2º Os balões juninos somente poderão ser soltos nos meses de junho e julho e em eventos típicos de festas juninas, mediante notificação do organizador do evento à autoridade competente.
Art. 5º É vedada a prática das atividades de baloeirismo aos menores de dezoito anos, salvo se devidamente acompanhado de seu responsável legal.
Parágrafo Único. A prática de baloeirismo por menor de dezoito anos acarreta a aplicação da medida prevista no art. 101, inciso IV, da Lei nº 8.069, de 13 de julho de 1990 (Estatuto da Criança e do Adolescente - ECA).
Art. 6º Respondem solidariamente pelos danos causados à integridade física das pessoas e ao patrimônio, nos termos do parágrafo único do art. 927 do Código Civil, o praticante de baloeirismo e o organizador do evento.
Parágrafo único. O organizador do evento e os responsáveis pelo balão deverão zelar pela sua segura recuperação e devem providenciar a correta disposição final e eliminação dos eventuais resíduos sólidos gerados no meio ambiente decorrentes da prática de do baloeirismo.
Art. 7º A atividade de baloeirismo, realizada nos moldes desta Lei, presume a ausência de potencialidade ofensiva, salvo se colocar efetivamente em perigo ou causar danos reais as pessoas, ao meio ambiente e ao património, hipótese em que aplicar-se-á o disposto no art. 42 da Lei nº 9.605, de 1998.
Art. 8º Compete à autoridade ambiental definir a forma de Contrapartida Ambiental em proporcionalidade a magnitude do evento.
Art. 9º Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação. 

                                      JUSTIFICAÇÃO

        A devoção aos santos católicos, introduzida no Brasil pelos portugueses, ainda nos tempos de colonização, resultaram em manifestações folclóricas genuinamente brasileiras em louvor a Santo Antônio, São João e São Pedro, as Festas Juninas – que na atualidade tem o relevante papel de ressaltar a importância dos hábitos e valores rurais na sociedade brasileira. Foi durante os preparativos dos festejos juninos que pais, filhos e alguns amigos próximos, aprenderam o fabrico artesanal dos balões.
        Nos rituais das festas juninas, o balão de papel cumpre a função de elo de comunicação entre o céu e a terra, simbolizando para alguns a fé de verem seus pedidos realizados e, para outros, significando agradecimentos aos céus.
        Nos centros urbanos a população aprendeu e se apropriou dos  elementos juninos conservando-os em  um  novo  espaço, contribuindo assim  para a sua preservação, ainda que para isso tenha lhes conferido nova significação e, até mesmo, uma nova temporalidade.
        No ambiente urbano, percebe-se que os balões de papel passam igualmente a constar na celebração de outras datas festivas, tais como o dia das mães, o dia de São Jorge, o Natal, o Ano Novo e o dia da padroeira do Brasil, Nossa Senhora Aparecida e, gradativamente, começam a fazer parte de comemorações familiares ou relacionadas a eventos esportivos.
        Assim como o folclore das festas juninas, a tradição da confecção, soltura e resgate do balão de papel está, há anos, difundida por todo território brasileiro. Fato comprovado pela vasta produção artística que a ele faz referência. Inúmeras são as músicas, poemas, filmes e pinturas que ilustram a presença do balão de papel no cotidiano da população brasileira.
        Os balões também evoluíram, seja em razão do tamanho, da beleza, do refinamento artístico e do aprimoramento técnico, sempre como forma de reunir pessoas diferentes, mas com um objetivo em comum. Desta maneira, a soltura de um balão de papel revela-se um ritual que oferece aos baloeiros e apreciadores da manifestação, a oportunidade de renovação das emoções que alimentam a estética social que os congrega em suas comunidades.
        O prestígio alcançado pelos baloeiros brasileiros, cujo modo de fazer balões de papel é mundialmente reconhecido pela excelência em técnica e arte, confirma que a cultura do balão atualmente integra o Brasil, de forma específica, em um contexto milenar e cultural mundial. Os baloeiros brasileiros são convidados de honra em eventos realizados anualmente na França, Portugal, México, Colômbia e Itália.
        Apesar de ser uma das expressões plásticas mais importantes do povo brasileiro e de constituir inestimável elemento de agregação social, imprescindível pelo seu significado histórico-cultural, a sua prática desregrada proporciona risco potencial ao ambiente, às pessoas e ao patrimônio em geral.
        Visando coibir esta prática irresponsável, o art. 42 da Lei nº 9.605/98 (Lei de Crimes Ambientais), deu amparo legal a intensificação das ações de repressão policial e a elaboração de campanhas radicais que objetivam a erradicação desta manifestação da cultura popular. Porém as atividades criminalizadas pelo art. 42   da Lei nº 9.605/98 são de difícil fiscalização por parte da polícia. Em regra só ocorrem prisões em razão da denúncia. Com a regulamentação desonera-se o  policiamento, uma vez que as atividades envolvendo a prática do balão serão definidas pelo próprio Poder Público e de conhecimento prévio da autoridade estatal.
        O art. 42 da Lei nº 9.605/98, ao coibir a confecção e soltura de balões contraria o disposto nos arts.1º, III, 3º, IV, 5º, 215 e 216  da Constituição Federal, a Convenção sobre a Proteção e Promoção da Diversidade das Expressões Culturais da UNESCO, ratificada pelo Brasil em 2007, que tem como principal objetivo a proteção e a promoção da diversidade de expressões culturais, e o Plano Nacional de Cultura do Ministério da Cultura.
        Cumpre observar que entre os beneficiários da Convenção da UNESCO estão “diversos grupos sociais, incluindo as mulheres, minorias e povos indígenas, ao incluir entre as obrigações das Partes a garantia de um ambiente propício à criação, produção, disseminação e usufruto das expressões culturais desses grupos”.
        “A Convenção parte do pressuposto de que a criatividade cultural, que é uma face da diversidade cultural, é compartilhada por toda a humanidade”.  “A Convenção não aspira a controlar ou mesmo restringir, mas sim promover e proteger a diversidade de expressões culturais”. “Cada  forma  de  criação proporciona ligações entre regiões, indivíduos e gerações inteiras, que constroem assim legado às gerações futuras”. “Ao enfocar a diversidade de expressões cultura, a Convenção contribui para a “defesa da diversidade cultura como imperativo ético inseparável do respeito pela dignidade humana.”


         O Plano Nacional de Cultura – MinC  determina o reconhecimento e o apoio à produção cultural:
        “Não cabe aos governos ou às empresas conduzir a produção de cultura, seja ela erudita ou popular, impondo-lhe hierarquias e sistemas de valores. Para evitar que isso ocorra, o Estado deve permanentemente reconhecer e apoiar práticas, conhecimentos e tecnologia sociais, desenvolvidos em todo o País, promovendo o direito à emancipação, à autodeterminação e à liberdade de indivíduos e grupos. Cabe ao poder público estabelecer condições para que as populações que compõem a sociedade brasileira possam criar e se expressar livremente a partir de suas visões de mundo, modos de vida, suas línguas, expressões simbólicas e manifestações estéticas. O Estado deve garantir ainda o pleno acesso aos meios, acervos e manifestações simbólicas de outras populações que forma o repertório da humanidade”.
        (...) “A cultura é feita de símbolos, valores, rituais que criam múltiplos pertencimentos, sentidos e modos de vida. A diversidade cultural brasileira se atualiza – de maneira criativa e ininterrupta – por meio de linguagens artísticas, múltiplas identidades e expressões culturais. As políticas públicas de cultura devem adotar medidas, programas, ações e políticas para reconhecer, valorizar, proteger e promover a diversidade cultural. O Brasil, cuja formação social foi marcada por sincretismos, hibridação e encontros entre diversas matrizes culturais, possui experiência histórica de negociação da diversidade e de reconhecimento de seu valor simbólico. O PNC oferece uma oportunidade histórica para adequação da legislação e da institucionalidade da cultura brasileira à Convenção da Diversidade Cultura da Unesco, firmando a diversidade como referência das políticas de Estado e com elo de articulação entre segmentos populacionais e comunidades nacionais e internacionais”.
(Fonte: http://www.cultura.gov.br/site/wp-content/uploads/2007/12/cadernopnc.pdf )
         Vale observar que tanto esta Convenção da UNESCO como a Emenda Constitucional 48, que acrescentou o parágrafo 3º ao art. 215 da Constituição Federal, promoveram novo tratamento jurídico às formas de expressão cultural brasileiras, e ambas são posteriores à lei de crimes ambientais.
        O presente projeto visa “... separar o joio do trigo” para assim preservar o que há de mais belo e de mais significativo nesta original expressão popular, sem, contudo, deixar de observar a necessidade de se garantir segurança ao patrimônio e ao meio ambiente. Para tanto, procuramos harmonizar e delimitar de forma técnica os indispensáveis conceitos e características desta atividade.
        Contamos com o apoio dos nobres Pares para aprovação da presente proposta.

                       Sala das Sessões, 6 de novembro de 2013.

                           Deputado HUGO LEAL
                                   PROS/RJ

        Humberto Pinto Cel

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