PROJETO DE LEI Nº7622 DE 2013
(Do Sr.
Hugo Leal)
Disciplina as atividades envolvendo balões de papel não
tripulados e sem potencialidade de causar incêndio, reconhecendo-as como
elemento da cultura popular e do folclore brasileiro.
O Congresso
Nacional decreta:
Art.
1º
A presente Lei disciplina as atividades envolvendo balões de papel não tripulados
e sem potencialidade de causar incêndio, reconhecendo-as como elemento da cultura popular e do folclore brasileiro.
Art.
2º
Para os efeitos desta Lei entende-se por atividades de baloeirismo a confecção artesanal,
a soltura e o resgate, independente da modalidade, individual ou coletiva, de balões
de papel não tripulados, desprovidos de potencialidade ofensiva à integridade física
e/ou patrimonial.
§
1º
Não integra a prática da atividade de baloeirismo o comércio e o transporte de balões de papel não
tripulados e sem potencialidade de causar incêndio.
§ 2º
Todo
e qualquer conhecimento de confecção de artefato, mecanismo ou dispositivo
relacionado com a prática do baloeirismo, será de domínio público.
Art.
3º
Considera-se, para todos os efeitos legais, sem potencialidade de causar
incêndio, a atividade de baloerismo que observar os seguintes critérios
técnicos:
I - balão de
papel, sem potencialidade de causar incêndio, o artefato confeccionado em
‘papel seda’ ou de baixa gramatura, inflado por maçarico e mantido no ar por
tocha, mecha ou bucha:
a) autoextinguível, em razão
da relação entre o volume e o peso do material utilizado na tocha e da
observação das condições meteorológicas; ou
b) extinguível por
sistema de supressão do fogo que, além das características da alínea
"a", seja equipado com sistema mecânico ou eletromecânico de extinção
do fogo.
II - balão solar,
sem potencialidade de causar incêndio, artefato de papel seda inflado por
maçarico e mantido no ar exclusivamente por energia térmica de origem solar;
III – balão junino,
sem potencialidade de causar incêndio, o artefato de papel seda, com
comprimento de até duzentos centímetros, com diâmetro de boca correspondente a,
no mínimo, quinze por cento de seu tamanho e mantido no ar por meio de tocha, mecha
ou bucha autoextinguível, elaborada com algodão e parafina, pesando até cento e
cinquenta gramas.
§
1º
Considera-se mecha, tocha ou bucha seca autoextinguível, a fabricada em algodão
hidrófilo ou papel tissue e parafina, totalmente consumível durante a
permanência do balão no ar, sem deixar qualquer vestígio ou resíduo capaz de causar incêndio.
§
2º
O balão de papel observará ainda as seguintes características:
I - placa de identificação
metálica acoplada à boca, que identifique, mediante inscrição vazada ou em
relevo, o responsável por sua soltura;
II - o número da
autorização de soltura fornecida pelo órgão do Poder Público competente;
III - equipamento
refletor de radar do controle de tráfego aéreo, conforme regulamentação da
autoridade aeronáutica, quando necessária;
IV - sistema
mecânico acionado pela própria combustão da tocha, por temporizador e/ou através
de rádio controle, para limitar o seu tempo de voo, conforme
regulamentação da autoridade aeronáutica;
V - equipamento de
rastreamento, ressalvada a sua dispensa a critério das autoridades.
§
3º
O balão de papel de uso noturno deverá observar, além dos itens de segurança, a
presença de sinal luminoso estroboscópio ou similar a ser definido pela
autoridade aeronáutica.
§
4º
É vedado o uso de fogos de artifício como lastro ou carga para qualquer espécie
de balão de papel.
Art.
4º
O calendário anual de exposições, festivais e as revoadas de balões de papel, assim
como a prática de soltura fora destes eventos, serão realizadas em locais previamente definidos pelas autoridades
públicas responsáveis pela fiscalização e segurança.
§
1º
A autoridade pública responsável pela autorização e segurança deverá observar:
I - as condições
meteorológicas;
II - a proximidade
com as redes elétricas, a vegetação e a área urbana;
III - o provável
raio de alcance;
IV - a altura
altitude estimada a ser atingida;
V - a trajetória
presumida;
VI - a quantidade de
balões e seus respectivos tamanhos; e
VII - todos os
dados necessários para garantir a normalidade do tráfego aéreo, a preservação do meio
ambiente e a segurança dos cidadãos e do patrimônio público e privado.
§
2º
Os balões juninos somente poderão ser soltos nos meses de junho e julho e em eventos
típicos de festas juninas, mediante notificação do organizador do evento à
autoridade competente.
Art.
5º
É vedada a prática das atividades de baloeirismo aos menores de dezoito anos,
salvo se devidamente acompanhado de seu responsável legal.
Parágrafo
Único. A prática de baloeirismo por menor de dezoito anos
acarreta a aplicação da medida prevista no art. 101, inciso IV, da Lei nº
8.069, de 13 de julho de 1990 (Estatuto da Criança e do Adolescente - ECA).
Art.
6º
Respondem solidariamente pelos danos causados à integridade física das pessoas e
ao patrimônio, nos termos do parágrafo único do art. 927 do Código Civil, o praticante
de baloeirismo e o organizador do evento.
Parágrafo
único. O organizador do evento e os responsáveis pelo balão
deverão zelar pela sua segura recuperação e devem providenciar a correta disposição
final e eliminação dos eventuais resíduos sólidos gerados no meio ambiente
decorrentes da prática de do baloeirismo.
Art.
7º
A atividade de baloeirismo, realizada nos moldes desta Lei, presume a ausência de
potencialidade ofensiva, salvo se colocar efetivamente em perigo ou causar
danos reais as pessoas, ao meio ambiente e ao património, hipótese em que
aplicar-se-á o disposto no art. 42 da Lei nº 9.605, de 1998.
Art.
8º
Compete à autoridade ambiental definir a forma de Contrapartida Ambiental em
proporcionalidade a magnitude do evento.
Art. 9º Esta Lei entra em vigor na data
de sua publicação.
JUSTIFICAÇÃO
A devoção
aos santos católicos, introduzida no Brasil pelos portugueses, ainda nos tempos
de colonização, resultaram em manifestações folclóricas genuinamente
brasileiras em louvor a Santo Antônio, São João e São Pedro, as Festas Juninas
– que na atualidade tem o relevante papel de ressaltar a importância dos
hábitos e valores rurais na sociedade brasileira. Foi durante os preparativos dos
festejos juninos que pais, filhos e alguns amigos próximos, aprenderam o
fabrico artesanal dos balões.
Nos
rituais das festas juninas, o balão de papel cumpre a função de elo de
comunicação entre o céu e a terra, simbolizando para alguns a fé de verem seus
pedidos realizados e, para outros, significando agradecimentos aos céus.
Nos
centros urbanos a população aprendeu e se apropriou dos elementos juninos conservando-os em um
novo espaço, contribuindo
assim para a sua preservação, ainda que
para isso tenha lhes conferido nova significação e, até mesmo, uma nova
temporalidade.
No
ambiente urbano, percebe-se que os balões de papel passam igualmente a constar na celebração de outras datas
festivas, tais como o dia das mães, o dia de São Jorge, o Natal, o Ano Novo e o
dia da padroeira do Brasil, Nossa Senhora Aparecida e, gradativamente, começam
a fazer parte de comemorações familiares ou relacionadas a eventos esportivos.
Assim
como o folclore das festas juninas, a tradição da confecção, soltura e resgate
do balão de papel está, há anos, difundida por todo território brasileiro. Fato
comprovado pela vasta produção artística que a ele faz referência. Inúmeras são
as músicas, poemas, filmes e pinturas que ilustram a presença do balão de papel
no cotidiano da população brasileira.
Os balões
também evoluíram, seja em razão do tamanho, da beleza, do refinamento artístico
e do aprimoramento técnico, sempre como forma de reunir pessoas diferentes, mas
com um objetivo em comum. Desta maneira, a soltura de um balão de papel revela-se um ritual que oferece aos baloeiros e apreciadores da manifestação, a oportunidade de
renovação das emoções que alimentam a estética social que os congrega em suas
comunidades.
O prestígio
alcançado pelos baloeiros brasileiros, cujo modo de fazer balões de papel é mundialmente
reconhecido pela excelência em técnica e arte, confirma que a cultura do balão
atualmente integra o Brasil, de forma específica, em um contexto milenar e cultural
mundial. Os baloeiros brasileiros são convidados de honra em eventos realizados
anualmente na França, Portugal, México, Colômbia e Itália.
Apesar de
ser uma das expressões plásticas mais importantes do povo brasileiro e de
constituir inestimável elemento de agregação social, imprescindível pelo seu
significado histórico-cultural, a sua prática desregrada proporciona risco
potencial ao ambiente, às pessoas e ao patrimônio em geral.
Visando coibir
esta prática irresponsável, o art. 42 da Lei nº 9.605/98 (Lei de Crimes Ambientais),
deu amparo legal a intensificação das ações de repressão policial e a
elaboração de campanhas radicais que objetivam a erradicação desta manifestação
da cultura popular. Porém as atividades criminalizadas pelo art. 42 da Lei nº 9.605/98 são de difícil
fiscalização por parte da polícia. Em regra só ocorrem prisões em razão da
denúncia. Com a regulamentação desonera-se o
policiamento, uma vez que as atividades envolvendo a prática do balão
serão definidas pelo próprio Poder Público e de conhecimento prévio da
autoridade estatal.
O art. 42
da Lei nº 9.605/98, ao coibir a confecção e soltura de balões contraria o
disposto nos arts.1º, III, 3º, IV, 5º, 215 e 216 da Constituição Federal, a Convenção
sobre a Proteção e Promoção da Diversidade das Expressões Culturais da UNESCO,
ratificada pelo Brasil em 2007, que tem
como principal objetivo a proteção e a promoção da diversidade de expressões culturais,
e o Plano Nacional de Cultura do Ministério da Cultura.
Cumpre
observar que entre os beneficiários da Convenção da UNESCO estão “diversos
grupos sociais, incluindo as mulheres, minorias e povos indígenas, ao incluir
entre as obrigações das Partes a garantia de um ambiente propício à criação,
produção, disseminação e usufruto das expressões culturais desses grupos”.
“A
Convenção parte do pressuposto de que a criatividade cultural, que é uma face
da diversidade cultural, é compartilhada por toda a humanidade”. “A Convenção não aspira a controlar ou mesmo restringir,
mas sim promover e proteger a diversidade de expressões culturais”. “Cada forma
de criação proporciona ligações
entre regiões, indivíduos e gerações inteiras, que constroem assim legado às gerações futuras”. “Ao enfocar a diversidade de expressões cultura, a
Convenção contribui para a “defesa da diversidade cultura como imperativo ético
inseparável do respeito pela dignidade humana.”
O Plano Nacional de Cultura – MinC
determina o reconhecimento e o apoio à produção cultural:
“Não cabe aos governos ou às empresas conduzir
a produção de cultura, seja ela erudita ou popular, impondo-lhe hierarquias e sistemas
de valores. Para evitar que isso ocorra, o Estado deve permanentemente reconhecer
e apoiar práticas, conhecimentos e tecnologia sociais, desenvolvidos em todo o
País, promovendo o direito à emancipação, à autodeterminação e à liberdade de
indivíduos e grupos. Cabe ao poder público estabelecer condições para que as
populações que compõem a sociedade brasileira possam criar e se expressar
livremente a partir de suas visões de mundo,
modos de vida, suas línguas, expressões simbólicas e manifestações estéticas. O
Estado deve garantir ainda o pleno acesso aos meios, acervos e manifestações
simbólicas de outras populações que forma o repertório da humanidade”.
(...) “A cultura é feita de símbolos, valores,
rituais que criam múltiplos pertencimentos, sentidos e modos de vida. A
diversidade cultural brasileira se atualiza – de maneira criativa e
ininterrupta – por meio de linguagens artísticas, múltiplas identidades e
expressões culturais. As políticas públicas de cultura devem adotar medidas, programas,
ações e políticas para reconhecer, valorizar, proteger e promover a diversidade
cultural. O Brasil, cuja formação social foi marcada por sincretismos,
hibridação e encontros entre diversas matrizes
culturais, possui experiência histórica de negociação da diversidade e de
reconhecimento de seu valor simbólico. O PNC oferece uma oportunidade histórica
para adequação da legislação e da institucionalidade da cultura brasileira à
Convenção da Diversidade Cultura da Unesco, firmando a diversidade como referência das políticas de Estado e com elo
de articulação entre segmentos populacionais e comunidades nacionais e
internacionais”.
(Fonte:
http://www.cultura.gov.br/site/wp-content/uploads/2007/12/cadernopnc.pdf )
Vale observar que tanto esta Convenção
da UNESCO como a Emenda Constitucional 48, que acrescentou o parágrafo 3º ao
art. 215 da Constituição Federal, promoveram novo tratamento jurídico às formas
de expressão cultural brasileiras, e ambas são posteriores à lei de crimes
ambientais.
O presente projeto visa “... separar o
joio do trigo” para assim preservar o que há de mais belo e de mais
significativo nesta original expressão popular, sem, contudo, deixar de
observar a necessidade de se garantir segurança ao patrimônio e ao meio
ambiente. Para tanto, procuramos harmonizar e delimitar de forma técnica os
indispensáveis conceitos e características desta atividade.
Contamos com o apoio
dos nobres Pares para aprovação
da presente proposta.
Sala das Sessões, 6 de
novembro de 2013.
Deputado HUGO LEAL
PROS/RJ
Humberto Pinto Cel